As Dores da Alma
Francisco do Espírito Santo Neto
Pelo espírito Hammed
Desprezar é sentir ou manifestar desconsideração por alguém ou por
alguma coisa; portanto, é uma atitude sempre inadequada nas estradas de nossa
existência evolutiva. Menosprezar é um sentimento pelo qual nos colocamos acima
de tudo e de todos, avaliando com arrogância os acontecimentos e os fatos do
alto da “torre do castelo” de nosso orgulho.
A nenhuma coisa ou criatura deve-se atribuir o termo
“desprezível”, pois tudo o que existe sobre a Terra é criação divina; logo,
útil e proveitosa, mesmo que agora não possamos compreender seu real significado.
Talvez não entendamos de imediato nosso papel na vida, mas podemos
ter a certeza de que todos somos importantes e todos fomos convocados a dar
nossa contribuição ao Universo.
A cada instante, estamos criando impressões muito fortes na
atmosfera espiritual, emocional, mental e física da comunidade onde vivemos.
Todo envolvimento na vida tem um propósito determinado cujo entendimento, além
de esclarecer nosso valor pessoal, favorecerá o amor, o respeito e a aceitação
de cada um de nossos semelhantes.
Frequentemente, dizemos que certas pessoas são indispensáveis e
que muitos indivíduos são improdutivos, e perguntamos mais além: qual o
propósito da vida para com estas criaturas ociosas?
Não julguemos, com nossos conceitos apressados, os acontecimentos
em nosso derredor; antes, aguardemos com calma e façamos uma análise mais
profunda da situação. Assim agindo, poderemos avaliar melhor todo o contexto
vivencial.
“Desempenham função útil no Universo os Espíritos inferiores e
imperfeitos. Todos têm deveres a cumprir. Para a construção de um edifício, não
concorre tanto o último dos serventes de pedreiro, como o arquiteto?” ([1])
Nenhuma ocorrência, fato ou pensamento deverá ser sentido ou
analisado separadamente, pois o “Grande Sistema”, que nos rege, age de forma
interdependente.
Apesar de sermos únicos, todos fomos criados para contribuir
coletivamente no mundo e para usar as possibilidades de nossa singularidade.
Para tudo há um sentido e uma explicação no Universo. Sempre
estará implícita uma mensagem proveitosa para nosso progresso espiritual,
muitas vezes, porém, de forma inarticulada e silenciosa
Nunca nos esqueçamos de que a vida sempre agirá em nosso
benefício, quer nos setores da solidão, quer nos de muitas companhias, ou seja,
entre encontros, desencontros e reencontros. A aflição também é um benefício:
“Todo sofrimento é um ato importantíssimo de conhecimento e aprendizagem.”
Se bem entendermos, no entanto, as verdadeiras intenções das
lições a nós apresentadas, retiraremos tesouros imensos de progresso e
amadurecimento espiritual.
As dificuldades que a vida nos apresenta têm sempre um caráter
educativo. Mesmo que as vejamos agora como castigo ou punição, mais tarde
tomaremos consciência de que eram unicamente produtos de nosso limitado estado
de compreensão e discernimento evolutivo.
Descobrir a vida como um todo será sempre um constante processo de
trabalho dos homens. Efetivamente, a vida é trabalho e movimento, e para
fazermos nosso aprendizado evolutivo há um certo “tempo de gestação”, se assim
podemos dizer. Na vida nada está perdido; aliás, existe a época certa para cada
um saber o que é preciso para se desenvolver.
Nosso orgulho quer transformar-nos em super-homens, fazendo-nos
sentir “heroicamente estressados”, induzindo-nos a ser cuidadores e juízes dos
métodos de evolução da Vida Excelsa e, com arrogância, nomear os outros como
desprezíveis, ociosos, improdutivos e inúteis.
Poderemos “agir no processo” de formação e progresso das
criaturas, nunca “forçar o processo” ou criticar o seu andamento.
A pretensão do orgulhoso leva-o a acreditar que existe uma
“santidade desvinculada da realidade humana”, ou seja, organizada e estruturada
de forma diferente dos princípios pertencentes à Natureza; portanto, não é de
ordem divina, mas é da mentalidade deturpada de alguns místicos do passado.
Nada é inútil no Universo. A Divindade age sem cessar em
solicitude e consideração a cada uma de suas criaturas e criações. O progresso
da humanidade é inevitável. Todos estamos progredindo e crescendo, ainda que,
algumas vezes, não nos apercebamos disso.
A compulsão de querer controlar a vida
alheia é fruto de nosso orgulho.
Para ser bom mestre não é preciso fazer seguidores ou discípulos,
nem mesmo possuir cortejos ou comitivas, mas simplesmente fazer com que cada
ser descubra em si mesmo o seu próprio guia. Não devemos ditar nossas regras
aos indivíduos, mas fazer com que eles tomem consciência de seus valores
internos (senso, emoções e sentimentos) e passem a usá-los sempre que necessário.
Essa a função dos que querem ajudar o progresso espiritual dos outros.
Os indivíduos portadores de uma personalidade orgulhosa se apoiam
em um princípio de total submissão às regras e costumes sociais, bem como o
defendem energicamente.
Utilizam-se de um impetuoso interesse por tudo aquilo que se
convencionou chamar de certo ou errado, porque isso lhes proporciona uma
fictícia “cartilha do bem”, em que, ao manuseá-la, possam encontrar os
instrumentos para manipular e dominar e, assim, se sintam ocupando uma posição
de inquestionável autoridade.
Quase sempre se autodenominam “bem-intencionados” e sustentam uma
aura de pessoas delicadas, evoluídas e desprendidas, distraindo os indivíduos
para que não percebam as expressões sintomáticas que denunciariam suas posturas
de severo crítico, policial e disciplinador das consciências.
Nos meios religiosos, os dominadores e orgulhosos agem
furtivamente. Não somente representam papéis de virtuosos, como também
acreditam que o são, porque ainda não alcançaram a autoconsciência.
Exigem e esperam obediência absoluta, são superpreocupados com
exatidão, ordem e disciplina, irritando-se com pequenos gestos que fujam aos
padrões preestabelecidos.
Possuem uma inclinação compulsiva ao puritanismo, despertando, com
isso, simpatia e consideração nas pessoas simplórias e crédulas. Algumas, no
entanto, por serem mais avisadas e conscientes, não se deixam enganar,
discernindo logo o desajuste “emocional”.
O capítulo X da segunda parte de “O Livro dos Espíritos” diz
respeito a “Ocupações e Missões dos Espíritos”. Dizem os Benfeitores que a
missão primordial das almas é a de “melhorarem-se pessoalmente” e, além disso,
“concorrerem para a harmonia do Universo, executando as vontades de Deus”. ([2])
A autêntica relação de ajuda entre as pessoas consiste em
estimular a independência e a individualidade, nada se pedindo em troca.
Ninguém deverá ter a pretensão de ser “salvador das almas”. A compulsão de
querer controlar a vida alheia é fruto de nosso orgulho.
O ser amadurecido tem a habilidade perceptiva de diagnosticar os
processos pelos quais a evolução age em nós; portanto, não controla, mas sim
coopera com o amor e com a liberdade das leis naturais.
Nenhuma pessoa pode realizar a tarefa de outra. As experiências
pelas quais passamos em nossa jornada terrena são todas aquelas que mais
necessitamos realizar para nosso aprimoramento.
Muitos de nós convivemos, outros ainda convivem, com indivíduos
que tentam cuidar de nosso desenvolvimento espiritual, impondo controle
excessivo e disciplina perfeccionista, não respeitando, porém, os limites de
nossa compreensão e percepção da vida.
São “censuradores morais”, incapazes de compreender as
dificuldades alheias, pois não entendem que cada alma apenas pode amadurecer de
acordo com seu potencial interno.
Não se têm notícias de que Jesus Cristo impusesse cobranças ou
tivesse promovido convites insistentes ao crescimento das almas. Teve como
missão, na Terra, ensinar-nos serenidade e harmonia, para entrarmos em comunhão
com “Deus em nós”.
Confiava plenamente no Sábio e Amoroso Poder que dirige o Universo
e, portanto, respeitava os objetivos da Natureza, que age no comportamento
humano, desenvolvendo-o de muitas maneiras. Sabia que a evolução ocorre de modo
inevitável, recebendo ou não ajuda dos homens.
O Mestre entendia que, se combatêssemos e lutássemos contra nossos
erros, poderíamos “potencializá-los”. Nunca usava de força e imposição, mas de
uma técnica para que pudéssemos desenvolver a “virtude oposta”.
“Mulher, onde estão aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou”
E ela disse: “Ninguém. Senhor.” E disse-lhe Jesus: “Nem eu também te condeno;
vai-te e não peques mais.” ([3])
Não censurou ou criticou a atitude inadequada, mas propiciou o
desenvolvimento da autoconfiança, para que ela encontrasse por si mesma seus
valores internos.
Nunca amadureceremos, se deixarmos os outros pensarem por nós e
determinarem nossas escolhas.
Não é a ajuda real, a que se referia Jesus, a crítica moralista, o
desejo de reformar os outros, o controle do que se deve fazer ou não fazer.
Antes, tais comportamentos revelam os traços de caráter dos indivíduos
orgulhosos e ainda distanciados da autêntica cooperação no processo de evolução
— que não os deixam perceber — que ocorre naturalmente na intimidade das
criaturas.
“Todos
têm deveres a cumprir. Para a construção de um edifício, não concorre tanto o
último dos serventes de pedreiro, como o arquiteto?”
[2] Questão 558 – Alguma outra coisa incumbe aos Espíritos fazer, que não seja melhorarem-se
pessoalmente?
“Concorrem para a harmonia do Universo, executando as vontades de Deus,
cujos ministros eles são. A vida espírita é uma ocupação continua, mas que nada
tem de penosa, como a vida na Terra, porque não há a fadiga corporal, nem as
angústias das necessidades.”
[3] João
8:10 e 11.
que texto maravilhoso !
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