A LUZ DO SOL QUE É DEUS!!

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PAZ E ALEGRIA!!!

terça-feira, 24 de abril de 2012

Desencarnação:
Processo de Transição
 EM http://www.ieja.org/portugues/Estudos/Artigos/p_desencarnacao.htm


Morte é a cessação da vida orgânica; desencarnação é a libertação do Espírito imortal, período de transição, na sua mudança de plano. "A morte é hereditária" (1) e quando o corpo morre, o Espírito está pronto para delivrar-se, porque "não é a partida do Espírito que causa a morte do corpo; esta é que determina a partida do Espírito;"(2) mas este, nem sempre está em condições de fazê-lo. Neste caso, a morte biológica acontece mas, o Espírito não se desprende, não se liberta, fica preso ao corpo físico, isto é, continua encarnado, porque "nem todos os que morrem desencarnam." (3)

"Disse-nos, certa vez, um suicida: ‘Não estou morto.’ E acrescentava: ‘No entanto sinto os vermes a me roerem.’ Ora indubitavelmente, os vermes não lhe roíam o perispírito e ainda menos o Espírito; roíam-lhe apenas o corpo. (...) Era antes a visão do que se passava com o corpo, ao qual ainda o conservava ligado o perispírito, o que lhe causava a ilusão, que ele tomava por realidade." (4)

A reencarnação não é um processo punitivo, mas educativo, pois aqui "é escola, é prisão, é hospital"; para atingir a perfeição, a felicidade e a plenitude, é necessário renovar-se na experiência da matéria densa.. Tendo escolhido o caminho do progresso, evoluído, e assim realizado a sua reforma íntima, ou, ao contrário estagnado, com a ressalva que, por mínimo que seja, sempre se evolui alguma cousa, inexoravelmente sobrevém a morte (Fig. 1) , que é a fatalidade do corpo físico, assim como "a evolução é a fatalidade do Espírito"(5), um dos objetivos da reencarnação.(4); o outro é " trabalhar para o Universo, como o Universo trabalha para nós, tal é o segredo do destino" (6), "é por o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação (...) e concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta." (4) (FIG. 1); este último é atingido consciente ou inconscientemente pelo Espírito. A reestruturação ou não de seu perispírito, vai depender em ter atingido ambos os objetivos, com influências importantes no seqüênciamento do processo desencarnatório. Quanto mais depurado esteja mais fácil se torna o seu desligamento gradual, porque "os laços se desatam, não se quebram." .(4)

Dois fatores são seqüenciais à morte (Fig. 1), ocorrendo paralelamente e vinculados às suas circunstâncias e ao grau evolutivo do Espírito desencarnante:

o desprendimento do corpo físico

a perturbação do Espírito.



Léon Denis assinala que deveríamos chorar na hora da reencarnação, que é um momento de intenso sofrimento para o Espírito, e rirmos na hora da morte, quando o Espírito se liberta, já que encarnação é seu encarceramento fluídico e a desencarnação a sua libertação; isto, é importante frisar, se o Espírito cumpriu os objetivos da encarnação, porque se não o fez, serão dois choros, um ao encarnar e o outro ao desencarnar, tal a influência que esta sua conduta projetará na desencarnação.
O desprendimento.

Ao reencarnar o Espírito se liga ao corpo, através de seu perispírito, que a ele se une, molécula a molécula, átomo a átomo e ao desencarnar, inversamente se desprende, também, átomo a átomo, molécula a molécula.

O princípio vital e´ "o interruptor da vida",(7) enquanto que o fluido vital é a eletricidade que carrega nossas baterias, o fluido cósmico animalizado; ao ser desligado aquele, a vida se esvai, cessa e sobrevem a morte (morte natural), que se dá por esgotamento do fluido vital ou embora com sua presença, por falência orgânica súbita (morte violenta), ficando ele impotente para transmitir o movimento da vida. (8) Esta fuga energética do corpo físico e do perispírito, que se encontravam dela impregnados, desde o primeiro instante da concepção, realiza-se de forma suave ou abrupta,(Fig. 1) de acordo com a sua distribuição, que é peculiar a cada ser, a cada órgão, a cada célula; há nos centros vitais ou de força, maior atividade vital e pontos de ligação com maior densidade entre o Espírito-perispírito e o corpo físico; destes o que tem mais forte esta união com o Espírito, via perispírito, é o centro coronário ou regente que, pelo fato mesmo, é o último que se desliga, desfazendo-se as conexões Espírito-perispírito-glândula pineal, a "glândula da vida espiritual". O rompimento destes laços fluídico-magnéticos que compõe o cordão fluídico ou de prata, representa o selo da desencarnação, iniciando-se pelas extremidades e terminando, como dissemos, no cérebro.

A natureza das demais ligações dos centros vitais, variam de acordo com cada ser, dependentes da evolução do Espírito, modulador e estruturador do perispírito e portanto de suas ligações com a matéria densa, através dos centros vitais controladores e seus órgãos súditos e que serviço prestou ao comandante de suas ações_ o Espírito. Assim quem usou desregradamente o sexo, ou praticou aborto, por exemplo, terá suas ligações com o centro vital genésico difíceis de serem desligadas; quem foi tabagista inveterado, igualmente terá fortes ligações fluídico-magnéticas com o centro cardíaco, a retardar o processo desencarnatório, e daí por diante.

Assim o desprendimento acontece de forma lenta (envelhecimento natural, doenças crônicas, etc.) por esgotamento do fluido vital, ou de forma abrupta (morte violenta: acidentes, desastres, assassinatos, suicídios) por injúria grave, determinando a incapacidade funcional orgânica definitiva.(FIG. 1); nos primeiros, o desligamento já vinha se fazendo quando ocorreu a morte e nos últimos, a morte corresponde ao início do processo desencarnatório; eqüivale a dizer que o período morte-libertação, genericamente, é maior nestes. Com os Espíritos evoluídos ocorre que o momento da morte corresponde ao da libertação, mas, ao contrário, certos Espíritos que têm seu perispírito ainda muito densificado, ficam presos ainda ao corpo, após a morte.

"O Espiritismo, pelos fatos cuja observação ele faculta, dá a conhecer os fenômenos que acompanham esta separação, que, às vezes, é rápida, fácil, suave e insensível, ao passo que doutras é lenta, laboriosa, horrivelmente penosa, conforme o estado moral do Espírito, e pode durar meses inteiros", (2) e até anos.

A perturbação.

A consciência é do Espírito e após a morte corporal, ele passa por um período variável de perturbação, de acordo com o estado moral da alma, "fruto das suas construções mentais, emocionais e volitivas" (9) e o gênero ou circunstâncias da morte, para voltar a readquiri-la.
O Espírito purificado se desvencilha dos tênues laços que o prendiam ao corpo físico, tomando então consciência de si mesmo, da sua volta ao mundo espiritual e da memória do passado, que é também do Espírito e aos poucos vai retornando do inconsciente, sediado no perispírito (8); este "livro misterioso, fechado a nossa vista, durante a vida terrena, abre-se no espaço. O espírito adiantado percorre-lhe à vontade as páginas (...)." (6) Nestes casos a sensação é de alívio, como quem acordou de uma intervenção cirúrgica e obteve alta, curado; não é pois, nem penosa, nem duradoura; é um despertamento, pois a "vida na carne é o sono da alma; é o sonho triste ou alegre." (6)

Naqueles Espíritos que não aproveitaram o retorno à vida corporal, para sua evolução, estagnados na escala do progresso, o desencarne será um processo extremamente doloroso, "tétrico, aterrador, ansioso (...) qual horrendo pesadelo" (10), demorado e a perturbação espiritual que se seguirá, será muito intensa e prolongada; muitas vezes, mal se lembram até da última encarnação e muito menos das outras, em mais uma concessão da bondade e da misericórdia divina, mas um dia o farão, pois terão que "entrar no conhecimento do seu estado, antes de serem levadas para o meio cósmico adequado ao seu grau de luz e densidade. "(6)
Na morte violenta, situação não esperada na maioria das vezes pelo Espírito, sua conscientização da morte e conseqüente passagem à vida espiritual é difícil e demorada, tanto mais prolongada quanto menor a evolução espiritual.

Na Espiritualidade.

A espiritualidade não está parada, nem contemplativa, ao contrário, trabalha incessantemente e "Espíritos evoluídos, com fortes vínculos com a caridade", (11) se incumbem da tarefa da desencarnação, ajudando nos desligamentos dos laços que unem o Espírito ao corpo físico, sob influxo do pensamento divino. Espíritos amigos e familiares, já desencarnados, colaboram nesta tarefa. Esta mesma atuação, pode ser prejudicada por Espíritos inimigos, obsessores até, que têm a finalidade de tornar o desligamento mais penoso, contribuindo também para maior perturbação do Espírito desencarnante, seu desafeto.

Destino dos componentes do homem.

Após a morte, o corpo físico desintegra-se, seguindo as leis físico-químicas, que também são divinas, nunca mais voltando a recompor-se, ou destinar-se à ressurreição, que seria desprovida de qualquer finalidade.

O fluido vital volta ao seu lugar de origem _ o fluido cósmico ou universal.
O perispírito poderá apresentar modificações em relação à sua densidade; não se segmenta e não se sedimenta; se depura, tornando-se tanto mais sutil quanto maior for o progresso espiritual.

O Espírito pode apresentar modificações em relação ao seu estado moral reencarnatório, porque o "Espírito evolui, tudo o mais se transforma", por menor que seja esta mesma evolução, às vezes mínima, o que não pode nunca acontecer, é retrogradar.
Conclusão

Um dia, depois da morte corporal, nós teremos um decisivo encontro marcado com nós mesmos, nos recônditos da nossa consciência, apanágio do Espírito, onde foram impressas por Deus as suas leis morais (4); aí serão julgados por ela, todos os nossos atos da senda reencarnatória, no uso do nosso livre arbítrio e comparados com os nossos propósitos ao reencarnar, escolhidos ou impostos pela justiça divina, sempre de acordo com as aptidões de cada um; depende de nós, e só de nós, se este será o "dia mais feliz de nossa existência", momento de puro êxtase ou, "ao contrário, o pior deles", o seu momento mais fatídico.

"Cremos que a educação para o desencarne implica na educação para a vida". (9), para que consigamos a morte de que nos fala Hernani Santanna :(12)
"A morte (...) é a liberdade !

É o vôo augusto para a luz divina,
sob as bênçãos da paz da eternidade!
É bem começo de uma nova idade,
antemanhã formosa e peregrina,
da nossa vera e grã felicidade."
BIBLIOGRAFIA

1 _ FORMIGA, Luiz Carlos D. "Dores, Valores, Tabus e Preconceitos", CELD Ed., maio/96, pg.89-102.
2 _ KARDEC, Allan. "A Gênese". 22ª ed. Trad. Guillon Ribeiro. 1980, pg. 215.
3 _ RIBEIRO, Gêmison. "Nem todos que morrem desencarnam." Revista Internacional de Espiritismo, Dez/1999, pg. 504.
4 _ KARDEC, Allan. "O Livro dos Espíritos". 68ª ed.: FEB, 1987. perg. 132, 155, 257, 621.
5 _ SANTOS, Edson Ribeiro dos. Comunicação pessoal.
6 _ DENIS, Léon. "O Problema do Ser, do Destino e da Dor." 4ª ed. 1936: FEB, pg. 167, 261, 323.
7 _ MELO, Jacob. "O Passe". 8ª ed.: FEB,1992, pg 60.
8 _ MOREIRA, Fernando Augusto. "Fisiologia da Alma". Revista Inter-nacional de Espiritismo, Out/2000, pg.399.
9 _ JERRI, Roberto. "A Fisiologia do Desencarne" A Reencarnação. Nº 414, ano XIII, 1º semestre, 1997, pg. 39 e 42.
10 _ KARDEC, Allan. "O Céu e o Inferno". 37ª ed. Trad. Manuel J. Quintão: FEB, 1991, pg. 169.
11 _ CARNEIRO, Oscar F. "Reflexões". Ozon Editor, 1960, pg. 15.
12 _ SANTANNA, Hernani. "Canção do Alvorecer". 2ª ed,: FEB, 1983, pg. 46.
(Artigo reproduzido com autorização do autor)

quarta-feira, 18 de abril de 2012

A HISTÓRIA DO LIVRO DOS ESPIRITOS - 155 ANOS!


1º título de "O Livro dos Espíritos": "Religião dos Espíritos"
Paulo Roberto Viola (Para a Revista ESPÍRITA ALÉM DA VIDA)
O método e os meios escolhidos pelo Plano Espiritual para trazer ao Planeta "O Livro dos píritos", primeira obra da codificação kardequiana, já foi uma evidência inequívoca de que se tratava de um fenômeno mediúnico absolutamente autêntico, impossível de ser blefado por jovens e ingênuas meninas psicógrafas, que produziam as informações-respostas, a partir de um lápis de pedra amarrado a um cesta de vime, escrevendo, mediante impulso mediúnico, sobre um rudimentar quadro de ardósia, nascendo, assim, "O Livro dos Espíritos"...
Muitos espíritas ainda não sabem que "O Livro dos Espíritos" - completando nesse ano de 2007, em 18 de abril, 150 anos de sua formulação, o primeiro da codificação de Allan Kardec - foi composto basicamente de forma surpreendente por duas jovens irmãs, médiuns psicografantes, as meninas Caroline Baudin, de 18 anos e Julie Baudin, de apenas 15 anos.
O método de psicografia indireta não poderia ter sido mais rudimentar, como veremos mais adiante. Foi dentro deste contexto histórico que o codificador da Doutrina Espírita, Allan Kardec, encontrou um ex-companheiro de fé, um espírito desencarnado que se identificou simplesmente como Zéfiro. É que o codificador do Espiritismo fora sacerdote de uma antiga filosofia denominada Druída, agora em novo renascimento, na França, sob o nome de Hippolyte Leon Denizard Rivail.

Quem vai contar a surpreendente história é Canuto Abreu, sobre quem Chico Xavier disse:
“As tuas anotações não constituem obra do acaso, mas revivescências de lembranças” (mensagem de Emannuel, na psicografia de Francisco Cândido Xavier, para Canuto Abreu).
Raras narrativas históricas contam esse reencontro de Kardec com o Espírito Zéfiro. Um desses relatos veio num artigo – supostamente inspirado no famoso e respeitável escritor Silvino Canuto Abreu - publicado em um jornal chamado “A Voz do Espírito’ – Edição número 89: Janeiro - Fevereiro de 1998, de autoria de Mauro Quintella (fonte: Portal do Espírito). Graças a essas escassas publicações, hoje os Espíritas sabem alguma coisa sobre a história de "O Livro dos Espíritos". Canuto Abreu, nascido em 1892 na cidade de Taubaté, em São Paulo, também escritor e emérito pesquisador, desencarnou em 1980. De sua autoria é uma preciosa obra chamada “O Livro dos Espíritos e Sua Tradição Histórica e Lendária” (Editora LFU), na verdade título de seus memoráveis artigos publicados no jornal chamado Unificação, editado pela União das Sociedades Espíritas de São Paulo, na década de 1950. Além de médico, o famoso confrade era também formado em Direito, iniciando a advocacia aos 22 anos de idade. Aprimorou seus conhecimentos na França, onde estudou teologia e ciências religiosas. Conhecia quase o mundo todo. Era autodidata e estudou o grego, o hebraico e o aramaico. Tinha ele uma paranormalidade marcada por significativos fenômenos mediúnicos.
Porém, não se sabe onde o autor colheu informações tão precisas sobre as jovens médiuns que compuseram "O Livro dos Espíritos", sabendo-se, todavia, que Canuto Abreu era dono de invejável cultura, com uma biblioteca de mais de 10.000 livros. Não se tem qualquer confirmação sobre se as preciosas informações que ele publicou foram colhidas por seus próprios canais mediúnicos, ou se resultaram de raros e preciosos documentos possivelmente obtidos em suas andanças pela Europa. Consta que durante a Segunda Grande Guerra Mundial, quando a França foi invadida pelos Exércitos de Hitler, teriam chegado às mãos de Canuto Abreu algumas relíquias históricas que poderiam estar arquivadas na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas (ver "Personagens do Espiritismo" de Antonio de Souza Lucena e Paulo Alves Godoy). A hipótese, porém, parece pouco provável, pois os diálogos e pormenores envolvendo fatos e situações que o famoso autor lança em sua obra, mais sugerem escrita mediúnica do que trabalho de pesquisa. Uma coisa, porém, ninguém duvida: a honorabilidade do escritor e, também, o ser humano especial que todos seus contemporâneos nele reconheciam, dono de uma reputação inegavelmente acima de qualquer suspeita.
Trata-se de um inquestionável Grande Vulto do Espiritismo, fato que se confirma, também, na mensagem que lhe endereçou, no dia 19 de agosto de 1952, o Espírito Emannuel, na psicografia de Francisco Cândido Xavier: "As tuas anotações, quanto à história dos pioneiros do Espiritismo, não constituem obra do acaso e, sim, tarefa de elevado alcance moral para a causa que pretendemos defender. Não definem mero arranjo literário para alimentar os caprichos de leitores famintos de novidade e emoção, nem compõem tessitura de fios dourados de ficção, objetivando efeitos especiais em nossos arraiais doutrinários. A tua obra é a revivescência de lembranças, que os soldados e operários de nosso movimento não podem esquecer sob as cinzas, de modo a içarem, cada vez mais alto, o estandarte luminoso da Nova Revelação, confiado aos homens para a glorificação de nossos mais elevados destinos. Imprescindível te mostres digno de tão sagrado depósito, espalhando-lhe as cintilações com todos os trabalhadores da Doutrina de amor e luz que há quase um século vem despertando a consciência da Humanidade para a nova era de trabalho e progresso que as Trevas, debalde, procuram rejeitar”.
Parece, pois, evidente diante de tal depoimento que qualquer suspeita sobre a confiabilidade do famoso informante histórico não merecerá qualquer acolhida responsável, mesmo porque não se tem notícia de qualquer outro relato que colida, direta ou indiretamente, com a informação de Canuto Abreu. Igualmente não se tem conhecimento de qualquer publicação, ou relato, que desautorize a versão histórica daquele confrade. Por oportuno, registre-se que Canuto Abreu prossegue seu trabalho na Espiritualidade. Em 2004, por ocasião do 4º Congresso Espírita Mundial, realizado na capital da França, o médium Raul Teixeira psicografou mensagem dele que homenageou o codificador. Naquela oportunidade, disse Canuto Abreu: “Allan Kardec veio ao Planeta para representar no campo físico a Equipe Luminosa do Espírito da Verdade, que jorrava claridade sobre o orbe sob a ação venturosa do Cristo Excelso”.

A história do "Livro", contada por Canuto Abreu
Consta que a família Baudin - Émile-Charles, Clémentine e as filhas Caroline e Julie - costumava fazer reuniões espíritas em seu lar quando ainda residia na Ilha da Reunião, uma colônia francesa, que surgiu do mar há três milhões de anos, graças à força de dois vulcões, na costa oriental da África, pertencente à França desde 1638. As reuniões espíritas dessa família na Ilha passaram a ser dirigidas por um Espírito, que se apresentou como seu Guia Espiritual. Quando lhe indagaram o nome, o visitante espiritual respondeu: “Sou o Zéfiro da verdade. Chamem-me por este nome” (Zéphyr). Zéfiro é o nome do vento do oeste na Costa Marítima e é também tido como uma brisa suave, sendo filho de Eos (deusa do amanhecer) e Astreu (um dos três personagens da mitologia grega). Zéfiro houvera esposado Íris e seus irmãos foram Bóreas, Noto e Euro.
Certa noite, Zérifo previu que a aquela família mudaria brevemente para Paris: “Lá, procurarei manter contato com um velho amigo e chefe, desde o nosso tempo de Druídas”. Nessa época, os Baudin não vislumbravam, nem de longe, a possibilidade de morar na França. No entanto, não demorou muito, veio uma crise no comércio do café e do açúcar, principais produtos das atividades agrícolas e comerciais da família, que, por essa razão, foi obrigada a mudar para a França, em 1855. Canuto Abreu conta que as reuniões mediúnicas continuaram em Paris. Zéfiro riscava suas respostas às perguntas da família Baudin e convidados.
Numa certa noite, o senhor Denizard Rivail e sua esposa Amelie Boudet, aceitaram o convite para participar de uma reunião espírita na casa da família Baudin. Presente naquela reunião o Espírito Zéfiro, Rivail foi por ele saldado de uma forma que ninguém inicialmente entendera: “Salve, caro Pontífice, três vezes salve!” Sem compreender o sentido daquela aparentemente bizarra saudação, os assistentes deliciaram-se em boas gargalhadas. “Pontífice?!...” Monsieur Baudin, sentia-se constrangido, não entendia o ocorrido e tentou atribuir ao caráter espirituoso de Zéfiro aquela possível brincadeira.
Mas o fato é que Rivail aceitou a descontração e devolveu:” “ minha bênção apostólica, meu filho”. E o pequeno público assistente novamente caiu em boas gargalhadas.
Mas o Espírito Zéfiro logo interviria para por fim à zombaria e ao constrangimento, explicando que Rivail houvera sido um alto sacerdote Druída, com o nome de Allan Kardec, ao tempo de Julio César, na antiga Gália, hoje França, nos anos 50 antes de Cristo. E que ele, Zéfiro, fora contemporâneo de Rivail em encarnação daqueles idos tempos. (os Druídas eram juízes, filósofos, professores, enfim personalidades respeitadíssimas e de altas funções na sociedade de etnia Celta, um povo guerreiro que acabou dominado pelo Imperador romano Julio César, depois de uma bárbara invasão do território celta. Os sacerdotes druídas professavam uma filosofia ocultista, passada oralmente de uns para outros, sem qualquer registro escrito. Por isso, muito pouco se sabe sobre eles).
Iniciaria-se, ali naquela reunião descontraída da família Baudin, um novo tempo de conhecimento para a Humanidade, “uma nova aurora”, como mais tarde anunciaria o famoso astrônomo amigo de Kardec, Camille Flammarion, uma Doutrina inovadora e reveladora, fincada num tripé até então inédito: a Religião, a Filosofia e a Ciência.
A partir daquele encontro de Zéfiro com Rivail, seriam fornecidas as primeiras respostas de "O Livro dos Espíritos". E as personagens mediúnicas escolhidas para a psicografia seriam justamente as jovens e pueris meninas, filhas do casal Baudin, Caroline e Julie, aquela com 18 anos e esta com apenas 15 anos. Aquelas duas meninas, com certeza sem qualquer preparo intelectual para desenvolver uma nova filosofia dessa superior magnitude, foi a ponte que o Além encontrou para fazer chegar ao Planeta o primeiro livro da Doutrina inaugurada por Allan Kardec.
- Não fomos nós que compusemos o Livro, mas os Guias, o Professor Rivail e o "roc" – disse a menina Caroline, em resposta à jovem Ermance Dufaux, que perguntou como o Livro foi composto, segundo a narrativa de Canuto Abreu. A família Dufaux, a que pertencia a menina e médium Ermance, fora apresentada a Rivail por madame Plainemaison, dama viúva que vivia de rendas deixada pelo seu falecido marido.
O "roc" era um lápis de pedra amarrado a uma tupia, ou seja, uma cestinha de vime, pelos quais os escritos iam surgindo numa lâmina de pedra portátil (ardósia). Por esse meio absolutamente rudimentar advieram as primeiras escritas psicográficas com que o Espírito Zéfiro começou a ditar o Livro inaugural da Codificação, que vai completar 150 anos, ou seja "O Livro dos Espíritos", que viria a ser revisto e complementado pela mediunidade de Ruth Celine Japhet, de 20 anos, sendo certo que “toda a obra, no fundo e na forma, foi ‘revista’ e ‘corrigida’ pelos próprios Espíritos que a inspiraram”, garante Canuto Abreu. E mais: “tanto as questões da primeira, quanto os comentários da segunda coluna resultaram dos ensinos dos Espíritos e não das elucubrações do senhor Rivail”. Ainda segundo o famoso autor, “Rivail observava tudo, tomava nota das respostas dadas pelos Espíritos a quem quer que fosse, quando continham, a seu ver, um ensinamento de utilidade geral. Limitava-se a saudar o Guia e a ouvir a leitura de suas respostas (...) Portava-se, na verdade, não como ‘aprendiz’, mas como ‘examinador’ severo. Discutia com o Espíritos como se fossem homens. Nada aceitava que não estivesse conforme a Razão.”(*)
Posteriormente, o Livro mereceu a colaboração final da jovem Aline Carlotti, médium psicógrafa e de psicofonia a cuja mediunidade Kardec submetera as questões mais complexas.
(*) Os dados pessoais, os traços e a personalidade de Kardec são descritos pelo "O Livro dos Espíritos e Sua Tradição Histórica e Lendária": Era filho de Jeanne Hippolyte e de Jean-Baptiste Antoine Rivail, um advogado e respeitável juiz do Tribunal da cidade de Lyon, onde nasceu em 3 de outubro de 1804, em plena Era napoleônica. “De cultura acima do normal nos homens ilustres de sua idade e do seu tempo, impôs-se ao geral respeito desde moço. Temperamento infenso à fantasia, sem instinto poético nem romanesco, todo inclinado ao método, à ordem, à disciplina mental, praticava, na palavra escrita ou falada, a precisão, a nitidez, a simplicidade, dentro dum vernáculo perfeito, escoimado de redundâncias (...). Tinha o rosto sempre pálido, chupado, de zigomas salientes e pele sardenta, castigada de rugas e verrugas. Fronte vertical comprida e larga, arredondada ao alto, erguida sobre arcadas orbitárias proeminente, com sobrancelhas abundantes e castanhas. Olhos pequenos e afundados, com olheiras e pápulas. Nariz grande. Bigode rarefeito, aparados à borda do lábio, quase todo branco. Semblante severo quando estudava ou magnetizava, mas cheio de vivacidade amena e sedutora quando ensinava ou palestrava. O que nele mais impressionava era o olhar estranho e misterioso, cativante pela brandura das pupilas pardas, autoritário pela penetração a fundo na alma do interlocutor. O que mais personalidade lhe dava era a voz, clara e firme, de tonalidade agradável e oracional. Sua gesticulação era sóbria, educada. Mantinha rigorosa etiqueta social diante das damas. Sua única jóia: uma aliança de ouro com auréola de prata”.
As quatro mocinhas, apesar de risonhas e elegantes, não eram fúteis, prossegue Canuto Abreu, que acrescenta: “O trato das coisas sérias, as palestras filosóficas e morais em que tomavam parte, os conselhos dos Guias, as comunicações edificantes, a convivência com pessoas cultas e, sobretudo, o adiantamento moral e intelectual que possuíam de existência anteriores faziam-nas preferirem, mesmo quando em palestras sociais ou a sós, assuntos construtivos”.
Uma dezena de médiuns voluntários colaborou na revisão das respostas dos Espíritos, a conselho do próprio Plano Espiritual. Nesse grupo revisor, destacavam-se Roustan, médium intuitivo; a senhora Canu, sonâmbula inconsciente; a senhora Leclerc, médium psicógrafa; a senhora Clèment, médium falante e vidente; a senhora Roger, clarividente notável e a senhora De Plainemaison, auditiva e inspirada, na casa de quem o professor Rivail começara, como simples curioso – não fazia muito tempo - a estudar o spiritualism, (movimento herdado dos Estados Unidos, em decorrência dos fenômenos das mesas girantes que envolveram as irmãs Fox), como narra a obra de Canuto Abreu.
Sabido é que depois de Zéfiro, conforme subscrito em Prolegômenos, (preâmbulo à Introdução de "O Livro dos Espíritos") compareceram na seqüência psicográfica desse primeiro livro vários Espíritos Superiores, sendo que Zéfiro já anunciara o comparecimento de alguns deles nas primeiras reuniões com o professor Rivail: Agostinho, João Evangelista, Vicente de Paulo João Evangelista e outros confirmados pela jovem Ermance Dufaux, como Sócrates, Fénelon, Swedenborg e Hahnemann.
Em reunião que promoveu em sua residência, após a conclusão de "O Livro dos Espíritos", com a finalidade de agradecer as colaborações recebidas, Kardec disse reconhecido: “um agradecimento particular às meninas Caroline, Julie e Ruth Celine. Pondo de lado os prazeres próprios da mocidade e sacrificando as horas de estudo e afazeres domésticos, elas se prestaram durante mais de um ano com o máximo desinteresse material e a melhor dedicação espiritual ao fatigante uso de seus dotes mediúnicos”. A riqueza do pormenor informativo confirma a impressão de que o dedo mediúnico de Canuto Abreu efetivamente trabalhou em resgate dessa memória histórica...
Em Prolegômenos, Kardec se omitiu sobre as meninas psicógrafas, que compuseram "O Livro dos Espíritos", para protegê-las: “Resolvi afrontar sozinho as ondas de oposição que o Livro vai suscitar. É meu dever ocultar ao grande público os nomes de nossas médiuns” (desabafo de Kardec, segundo Canuto Abreu).
Kardec, claro, foi obrigado a proteger as meninas psicógrafas, pois eram, como dito, jovens e do sexo feminino num mundo então coroado de preconceitos contra a mulher e, sobretudo, contra as Religiões não ortodoxas, ou que desafiassem o status quo religioso vigente (*). Afinal, o professor Rivail já houvera presenciado um diálogo entre o senhor Baudin e o senhor Dufaux, a respeito do livro “Vida de Luiz 9º Escrita por ele mesmo”, de autoria de sua filha Ermance, que fora censurado por conter passagens consideradas desrespeitosas à Santa Sé, segundo conta Canuto Abreu. “Lastimável que isso aconteça em plena metade do Século dezenove”, ponderou Rivail, preocupado com seu livro. Afinal, as pioneiras do Espiritismo, as irmãs americanas Fox, vinham sendo perseguidas cruelmente, excomungadas e repelidas em todas as comunidades, como também informa Canuto Abreu.
Por isso, muito pouco se sabe a respeito das históricas meninas que compuseram a base de "O Livro dos Espíritos". Não teria sido por outra razão que na Introdução e em Prolegômenos o codificador simplesmente informa que a obra foi escrita “por ordem e mediante ditado de Espíritos superiores (...), por muitos médiuns”, sem, entretanto, detalhar o método e as formas, de maneira a não expor as jovens meninas Caroline e Julie.
(*) No mês de setembro de 1861, o escritor e editor Maurice Lachâtre, refugiado, por perseguição da Igreja, em Barcelona, na Espanha, onde tinha uma Livraria, solicitou a Kardec três centenas de livros espíritas, inclusive "O Livro dos Espíritos". A remessa, logo que chegou a seu destino, foi totalmente apreendida por um auto de fé assinado pelo Bispo local, Antônio Palauy Termens e, no dia 9 de outubro, os livros foram atirados a uma fogueira, em cumprimento a uma sentença ditada sob influência eclesiástica. Em 1° de maio de 1864, "O Livro dos Espíritos" foi lançado no temido Index Librorum Prohibitorum, índice dos livros censurados e proibidos pela Igreja Católica, criado em 1559, pela Sagrada Congregação da Inquisição, para “prevenir a corrupção dos fiéis”. Ao lado de Kardec, figuraram nesse Index notáveis da Ciência e da Filosofia, como Rousseau, Montesquieu, Descartes, Copérnico, Galileu Galilei e tantos outros. O Index vigorou até 1966, quando o então Papa Paulo 6º o extinguiu definitivamente.

Em 18 de abril de 1857, Kardec estaciona uma carruagem, com 1200 volumes de "O Livro dos Espíritos", destinados à Livraria Dentu
Concluída a edição primeira de "O Livro dos Espíritos", numa bela manhã de sábado de primavera, Kardec sai de sua residência, em Paris, na Rue des Martyrs, número 8, segundo andar, com 1200 volumes da obra. O meio de transporte era uma carruagem. Ele se detém na Rue Montpensier, em frente à Galeria d’Orleans, no Palais Royal , para alcançar a Livraria Dentu, da viúva madame Mélanie Dentu. Silvino Canuto complementa a descrição da cena: “o ajudante de cocheiro, trajando uniforme cinzento, amarrotado e sujo, saltou da boléia e dirigiu-se à Livraria”. Esperava por Kardec e sua obra, além da proprietária da Livraria, um Gerente da loja identificado apenas pelo nome de Clément, que leu a nota de entrega remetida pela Tipografia De Beau e ordenou o desembarque dos livros. À tarde, Kardec volta à Livraria e constata que mais de meia centena de exemplares já haviam sido vendidos ao preço de 3 francos por unidade, preço que, segundo consta, ele achou inicialmente caro, mas foi convencido por madame Dentu de que estava de acordo com o mercado.

O título original do livro
"Religião dos Espíritos” – fora prudentemente modificado pelo codificador para “O Livro dos Espíritos”, primeiramente porque ele temia que a censura implicasse com o primeiro nome e também para que o leitor identificasse na obra um livro escrito pelos Espíritos. Na noite do dia 18 de abril de 1857 em que foi lançado "O Livro dos Espíritos", madame Rivail (Amélie-Gabrielle de Lacombe Boudet Rivail) – Gaby na intimidade – já se houvera recolhido aos aposentos do casal. Kardec, entretanto, foi para o escritório de sua residência e sentou-se à escrivaninha de carvalho, sob a luz bruxuleante de uma vela. Pegou seu caderno de memórias e anotou, conforme o relato de Canuto Abreu: “Mais de cem exemplares de "O Livro dos Espíritos" já se foram neste primeiro dia, doados ou vendidos. Cada volume será um grão de vida nova lançado ao coração de um homem velho. Se algumas sementes caírem em corações maduros haverá, por certo, gloriosas ressurreições. Mil e duzentas sementes da Verdade serão lançadas no terreno da opinião. Se uma só frondejar, nosso esforço não terá sido em vão." E conclui o codificador, segundo a confiável informação histórica do confrade paulista: “O Livro de hoje não é senão a primeira página da religião do futuro. À medida que o meio e o desenvolvimento da Idéia Nova o permitam. Operar-se-á lentamente lutando com adversidades poderosas, pisada aqui, adulterada acolá, esmagada num ponto, ressuscitada noutro, criticada por muitos, defendida por poucos, atraiçoada dentro de seus próprios muros pelos fracos a serviço das Trevas”. Nascia, assim, a Doutrina Espírita, uma nova luz para a Humanidade. Com Jesus e por Jesus!

terça-feira, 17 de abril de 2012

A concepção espírita de fatalidade

por Silvio e Silvia Seno Chibeni em
 http://www.espirito.org.br/portal/artigos/geeu/a-concepcao-espirita.html

1. Introdução {nota 1}


No capítulo "Da lei de liberdade" de O Livro dos Espíritos Allan Kardec analisou com lucidez diversas questões relativas à fatalidade, dedicando-lhes uma seção inteira. Neste artigo pretendemos expor brevemente a concepção espírita de fatalidade, estabelecida naquela seção e em obras complementares.

Ao iniciar qualquer estudo, é sempre conveniente ter clareza quanto ao significado preciso dos termos envolvidos. Consultando o dicionário, verificamos que fatalidade é a marca do que é fatal, a força que predispõe irrevogavelmente os acontecimentos, o destino. Fatal é aquilo que é certo, prescrito pelo destino, irrevogável, que necessariamente acontecerá, inevitável, decisivo, inadiável, funesto, nefasto.

As duas últimas acepções do adjetivo fatal indicam algo de caráter negativo. Na concepção vulgar, esse aspecto mistura-se às primeiras acepções, resultando daí a idéia de que a fatalidade é a ocorrência inevitável de alguma coisa ruim. Essa associação da predeterminação com algo trágico, nefasto, porém, não é necessária. Em um sentido geral, a noção de fatalidade é neutra quanto à natureza boa ou má dos acontecimentos. Ao inspecionarmos a seção sobre a fatalidade de O Livro dos Espíritos verificamos facilmente que é esta noção geral, neutra, que está sendo ali estudada; é, portanto, a que nos interessará neste trabalho também.

Como o próprio termo indica, dizer que um fato está predeterminado é afirmar que sua ocorrência é determinada de maneira certa pelo estado de coisas que a antecede. A noção de predeterminação pressupõe a existência de uma como que "amarração" entre os acontecimentos: uns levariam a outros infalivelmente.

Quando consideramos os acontecimentos do mundo de um modo geral, são concebíveis três possibilidades: 1) todos estariam predeterminados (determinismo); 2) nenhum estaria predeterminado (aleatoriedade); e, 3) apenas alguns estariam predeterminados. Conforme veremos, é esta última posição, intermediária entre os dois extremos, que é aceita pela ciência contemporânea e pelo Espiritismo.

Ao formular a pergunta 851 de O Livro dos Espíritos, que abre a seção sobre a fatalidade, Kardec esclarece que entende a fatalidade como a predeterminação completa dos acontecimentos. Ao longo da seção, são expostos os motivos pelos quais não pode existir a fatalidade nesse sentido extremo, de uma predeterminação de tudo quanto ocorre. São também indicadas as circunstâncias especiais em que pode haver um certo tipo de predeterminação dos acontecimentos. A compreensão satisfatória desses pontos requer a análise de vários conceitos filosóficos, como o de determinismo, o de livre-arbítrio, o de causalidade etc. É o que procuraremos fazer a seguir, de forma bastante simplificada.

2. Determinismo e livre-arbítrio


A tese filosófica do determinismo, discutida há milênios pelos filósofos, sustenta que tudo o que acontece está predeterminado, podendo em princípio ser previsto por quem possua conhecimento completo do mundo em um dado instante. O Universo seria comparável a uma imensa máquina em funcionamento automático e infalível.

No exame das questões relativas ao determinismo é de suma importância, quer do ponto de vista filosófico, quer espírita, distinguir os acontecimentos do âmbito exclusivo da matéria daqueles que envolvem seres de natureza espiritual.

Muitos filósofos e cientistas de épocas passadas sustentaram que a matéria comporta-se de forma completamente determinista. Com a criação da ciência moderna, nos séculos XVI e XVII, essa posição ganhou força, visto que as novas teorias mecânicas, que culminaram na monumental síntese newtoniana, incorporam o determinismo em suas equações fundamentais.

Com o ulterior desenvolvimento da ciência a crença no determinismo enraizou-se. No final do século XIX e início do século atual, a formulação do eletromagnetismo, da mecânica estatística e das teorias da relatividade dentro desse mesmo referencial conceitual foi freqüentemente interpretada como sua consolidação definitiva.

No entanto, essa visão de mundo suscitou dificuldades filosóficas de grande monta, quanto à sua compatibilização com o livre-arbítrio humano. Com efeito, a experiência psicológica da liberdade de nossos pensamentos e ações é algo indubitável. Mas essa experiência parece conflitar com o determinismo da matéria, qualquer que seja a concepção acerca da natureza humana. É interessante notar que, com seu senso filosófico apurado, Allan Kardec abre a referida seção sobre a fatalidade precisamente com uma questão sobre o conflito entre fatalidade plena e livre-arbítrio.

Na perspectiva materialista, tudo no homem seria matéria. Ele estaria, pois, sujeito ao mesmo determinismo que existe no movimento dos astros, na queda de uma pedra, no movimento de um relógio. Como conciliar isso com o fato de sentirmos, com toda a clareza de que é capaz o nosso entendimento, que levantamos ou abaixamos o braço, andamos para a esquerda ou a direita, dizemos isso ou aquilo, com inteira liberdade?

Dificuldade semelhante surge na visão dualista, segundo a qual o homem é um espírito ligado a um corpo. Se o corpo, que é matéria, tiver seus mínimos movimentos predeterminados, como poderá o espírito atuar livremente sobre ele, fazendo-o executar essa ou aquela ação?

Os esforços dos filófosos para solucionar o problema não alcançaram qualquer êxito. Felizmente, porém, ele tornou-se amplamente irrelevante com o advento da mecânica quântica, na década de 1920. Essa teoria descreve a estrutura íntima da matéria, e representa a mais abrangente, precisa e bem sucedida teoria científica de todos os tempos. Pois bem: ao contrário das demais teorias físicas, a mecânica quântica não prevê um comportamento totalmente determinista para a matéria. Além disso, sofisticados estudos teóricos e experimentais recentes indicaram que qualquer tentativa de reinstalar teorias deterministas na microfísica encontrará necessariamente dificuldades proibitivas.

Tais avanços da ciência parecem haver renovado o referencial conceitual no qual o problema do livre-arbítrio humano deve ser analisado. As perspectivas de se conceber o ser humano como um espírito livre que atua sobre um corpo material desbloquearam-se. Deve-se todavia notar que ainda quase nada foi feito nesse sentido nos círculos acadêmicos.{nota 2}

O Espiritismo, porém, há muito tempo estabeleceu essa concepção, por meio de suas investigações científicas dos fenômenos espíritas. Confirmou a visão dualista que situa o pensamento, a vontade e o sentimento do homem num espírito independente da matéria. Mostrou também que esse espírito antecede e sobrevive ao corpo. De acordo com os últimos avanços da ciência, o comando do corpo pelo espírito é perfeitamente compatível com as leis que regulam o comportamento da matéria, já que estas contemplam a existência de processos indeterministas no nível dos constituintes fundamentais dos corpos, como prótons, nêutrons, elétrons etc.

3. Fatalidade e relação de causa e efeito


Estudemos um pouco mais a questão da predeterminação dos acontecimentos do domínio exclusivo da matéria. Segundo a ciência contemporânea, muitos desses acontecimentos de fato são predeterminados. Os movimentos dos orbes celestes, a queda de uma maçã, a propagação de uma onda de rádio constituem exemplos típicos. Especificada a altura da qual a maçã cai, sua forma, a viscosidade do ar, a força gravitacional que sobre ela exerce a Terra etc., as leis da mecânica permitem em princípio o cálculo do tempo de queda e a velocidade que terá ao atingir o solo, entre outras coisas.

Se quisermos, podemos caracterizar esses eventos previstos como efeitos, e a força gravitacional e as condições iniciais da maçã como causas. Dadas as causas, seguem-se os efeitos de modo certo. Isso faz ver que a fatalidade parcial que existe no mundo material está ligada à existência de certas relações causais.

Conforme apontamos na seção anterior, a física contemporânea reconhece que, mesmo no âmbito puramente material, há processos indeterministas, que não seguem esse padrão de previsibilidade estrita. Nesses casos, as noções de causa e efeito continuam aplicáveis, embora em sentido ampliado: as causas não determinam os efeitos individualmente, mas apenas as probabilidades de sua ocorrência.

Ao considerarmos os eventos em que participam seres humanos, fatores novos intervêm, devido à presença do elemento espiritual dotado de livre-arbítrio. Esses eventos em geral também não são passíveis de uma descrição determinista.

Todavia, enquanto encarnados estamos em associação estreita com a matéria, sendo possível que o encadeamento estrito de alguns eventos materiais nos afete de modo direto ou indireto. Por exemplo, vários processos físicos, químicos e biológicos do corpo humano são, em boa aproximação, deterministas. A passagem de uma corrente elétrica intensa através do corpo provoca choques; a ingestão de determinada porção de uma substância venenosa causa a morte; doses apropriadas de radiação gama destroem tumores, enquanto que doses muito elevadas os ocasionam; a transpiração resfria a pele; e assim por diante.

Desse modo, na medida em que participamos do mundo material há certos acontecimentos que se podem dizer predeterminados em nossas vidas. O que os predetermina, porém, são leis físicas, químicas, biológicas, na presença de certas causas.

É indispensável observar que muitas dessas causas decorrem, a seu turno, de ações que livremente praticamos. No caso da ingestão do veneno, por exemplo, pode-se dizer que a pessoa fatalmente morrerá. A predeterminação da morte, todavia, é condicionada à prévia ingestão da substância tóxica, o que em geral depende da livre decisão de alguém. A morte não está predeterminada em termos absolutos: se o veneno não for ingerido, ou se for administrado um antídoto eficaz, ela não advirá.

Tudo isso é do escopo das ciências acadêmicas. O Espiritismo complementa-as de forma substancial, fornecendo o conhecimento de inúmeros e importantes outros vínculos causais entre os acontecimentos. Por sua própria concepção, tais ciências restringem sua análise ao aspecto material do ser humano. Não podem, assim, acompanhar os efeitos das ações humanas além da morte corporal, nem identificar causas e efeitos de natureza espiritual, presentes, por exemplo, em fenômenos mediúnicos, obsessivos e anímicos. Foi a ciência espírita que, pioneiramente, adentrou esse estudo utilizando-se de metodologia racional-experimental.{nota 3}

É nesse sentido que muitos autores espíritas costumam referir-se à chamada lei de causa e efeito, ou de ação e reação, que regula as ocorrências da vida, em um sentido amplo, englobando os eventos referentes ao ser espiritual. A lei de causalidade restrita ao domínio da matéria, que as ciências ordinárias estudam, pode ser entendida como caso especial dessa lei mais ampla.

4. Livre-arbítrio e relação de causa e efeito


Cada evento tem uma causa, em geral bastante complexa, envolvendo múltiplos eventos anteriores, próximos ou remotos no espaço e no tempo. Todos esses fatores têm de estar presentes para que o acontecimento se verifique. Voltando ao exemplo da maçã, para ela cair em tantos segundos e com tal velocidade uma série de condições têm de ser satisfeitas: força de atração, desprendimento da macieira, ar com uma certa viscosidade etc. É o conjunto dessas condições que, mais apropriadamente, se deve entender como a causa da queda, embora nas situações ordinárias se fixe a atenção em apenas algumas delas, por conveniência ou dificuldade de conhecê-las todas. A pergunta "Por que a maçã caiu desse modo?" pede a especificação de uma causa. Dependendo do interesse, a resposta enfocará um determinado componente da causa total: um dirá que foi porque a Terra a atraiu; outro, que foi porque se soltou do galho; outro ainda porque ventou forte, todos podendo estar certos.

Os acontecimentos de que diretamente participamos são passíveis de análise semelhante, ou seja, podemos investigar suas causas gerais ou particulares. Meu dedo se queimou porque o encostei numa uma panela quente; meu ritmo cardíaco aumentou agora porque acabo de correr; fiquei sonolento esta tarde porque me alimentei excessivamente no almoço. Nessas respostas, apenas os fatores mais salientes das causas foram apontados. As causas são, nesses casos, mais ou menos próximas no tempo, e dependem de escolhas que livremente fizemos: pegar a panela sem luvas, correr ao invés de andar, comer demais.

O Espiritismo mostra-nos que se as causas dos acontecimentos mais importantes de nossas vidas, felizes ou dolorosos, não puderem ser localizadas na vida presente, certamente existirão em passado anterior ao nosso renascimento. Os efeitos de nossos atos, conformes ou contrários à lei que vela pela harmonia do Universo, podem ser imediatos ou ocorrer em futuro mais ou menos distante. É isso, incidentalmente, que possibilita entender muitas das disparidades nas condições físicas, sociais etc., dos seres humanos dentro do quadro da justiça divina. Cada pessoa encontra-se num contexto parcialmente determinado pelo conjunto de suas ações desta vida, das vidas anteriores e dos períodos na erraticidade, sempre levadas em conta suas necessidades expiatórias, provacionais e de aprendizado de um modo geral.

A possibilidade de interferirmos no curso dos acontecimentos, agravando ou atenuando os efeitos ruins, promovendo ou embaraçando os efeitos bons, encontra-se claramente expressa na questão 860 de O Livro dos Espíritos, que agora transcrevemos em parte: {nota 4}

Pode o homem, pela sua vontade e por seus atos, fazer que se não dêem acontecimentos que deveriam verificar-se e reciprocamente?
"Pode-o, se essa aparente mudança na ordem dos acontecimentos tiver cabimento na seqüência da vida que ele escolheu. [...]"

Todas as nossas ações, por insignificantes que sejam, fazem-se acompanhar de certos efeitos, que se vão superpondo uns aos outros. Em cada momento, vivemos em meio a esse conjunto de efeitos. A importância prática de adquirirmos conhecimento acerca das leis que regem a matéria e o espírito reside em que, sabendo melhor quais serão os efeitos daquilo que fizermos, poderemos agir de modo a criar situações que nos aproximem da felicidade. Somos, por assim dizer, os construtores de nossos próprios destinos.

5. Programação da existência corporal


Boa parte das questões que formam a seção sobre a fatalidade de O Livro dos Espíritos referem-se direta ou indiretamente à questão da programação da existência corporal. Essa programação enquadra-se no princípio geral que estamos analisando. Na medida em que o ser amadurece espiritualmente, tornando-se mais consciente, poderá avaliar por si próprio as principais ações praticadas e, no estado de erraticidade, planificar certos aspectos de sua futura encarnação, freqüentemente auxiliado por Espíritos amigos. Assim é que, por exemplo, seu corpo, seu meio social, os componentes de seu grupo familiar poderão, em certa medida, ser objeto de escolha, com vistas às suas necessidades evolutivas.

Levando porém em conta que entre a época da programação e a da ocorrência programada os seres envolvidos continuarão agindo, criando novos efeitos que se juntarão aos anteriores, o fato poderá ser parcialmente alterado. Conforme assinala Allan Kardec no item 872, os detalhes dos acontecimentos dependem de circunstâncias que o próprio homem encarnado cria pelos seus atos.

Na resposta à questão 861 encontramos uma importante distinção, quanto à fatalidade, entre os acontecimentos materiais e os de ordem moral (espiritual):

"Demais, sempre confundis duas coisas muito distintas: os sucessos materiais da vida e os atos da vida moral. Se há, às vezes, fatalidade, é nos acontecimentos materiais cuja causa reside fora de vós e que independem da vossa vontade. Quanto aos atos da vida moral, esses emanam sempre do próprio homem que, por conseguinte, tem sempre a liberdade de escolher. No tocante, pois, a esses atos, nunca há fatalidade."

Podemos entender melhor esse ponto se considerarmos o fato, anteriormente apontado, de que somente a matéria, por ser inanimada e passiva, pode estar sujeita a um preordenamento preciso. Já os nossos atos, estes subordinam-se em cada instante à nossa vontade livre. Assim, um corpo malformado ou perfeito, uma doença grave ou sua cura, uma queda mortal, poderão ser fatais, no sentido mais estrito do termo. Mas um assassinato, uma difamação, uma reconciliação, uma doação caritativa nunca serão fatais. Note-se que isso vale para todas as partes envolvidas, mesmo as que ocupam a posição de vítimas. Ninguém pode renascer para ser alvo de difamação ou assassinato, porque isso exigiria que alguém renascesse para difamar ou assassinar, o que é claramente absurdo.

É por isso que a resposta da questão 851 adverte que a fatalidade só pode existir com relação às provas físicas (como certas doenças e acidentes que se não conseguem evitar), nunca porém com relação às provas morais (como as traições, os desgostos com o comportamento de entes queridos, as humilhações).

6. Previsão do futuro


O problema controverso da previsão do futuro também se elucida quando se compreendem corretamente as leis que correlacionam os eventos de nossas vidas. O futuro será, em princípio, previsível somente na medida em que se tenha acesso completo e seguro às causas dos eventos, e as leis que os correlacionem forem de tipo determinista. Dissemos em princípio porque, mesmo conhecendo completamente as causas e sendo as leis deterministas, faz-se ainda mister efetuar as deduções dos efeitos, o que em geral está fora de nossa capacidade prática.

Ora, no que toca aos acontecimentos não-triviais das vidas dos homens, ordinariamente nenhuma dessas três condições é satisfeita. Não conhecemos a totalidade das causas; não há encadeamento determinista dos eventos (devido à presença do livre-arbítrio); e, mesmo que houvesse, não seríamos efetivamente capazes de deduzir os efeitos das causas, dada a complexidade extrema das situações típicas.

Disso se conclui que, a não ser em condições muito especiais e limitadas, dentro do domínio exclusivamente material, o futuro é indeterminado e imprevisível. (Para maiores detalhes sobre esse assunto, consulte-se Chagas 1996.)

7. Aspectos morais


Com o esclarecimento racional fornecido pelo Espiritismo, as questões da fatalidade e do destino perdem o caráter místico com que freqüentemente são revestidas. Nada do que nos sucede é questão de sorte ou azar. Vemos que são quiméricas as idéias de que ocorrências de nossas vidas são influenciadas pelos astros, pelos nomes, pelos números e outros fatores externos semelhantes, que não encontram lugar na lei de causa e efeito e na justiça divina.

O mal que nos acontece, acontece na hora certa, na medida certa, porém como conseqüência de ações más livremente praticadas, nesta vida ou em vidas anteriores. Igualmente, as situações felizes que vivemos não são obra de puro acaso, mas foram preparadas por nós mesmos quando agimos de acordo com as recomendações evangélicas, ou seja, quando fazemos o bem.

Não há um destino transcendente, que nos arraste em seu turbilhão, independentemente do que sejamos ou façamos.{nota 5} O destino que existe é aquele que nós mesmos construímos, e que podemos ir modificando a cada momento, no quadro das leis naturais que regem o mundo. Esse ponto é expresso de forma muito feliz por Emmanuel no capítulo "Fatalidade e livre-arbítrio" do livro Nascer e Renascer, do qual destacamos os seguintes trechos:

É por isso que fatalidade e livre-arbítrio coexistem nos mínimos ângulos de nossa jornada planetária.
Geramos causas de dor ou alegria, de saúde ou enfermidade em vários momentos de nossa vida.
O mapa de regeneração volta conosco ao mundo, consoante as responsabilidades por nós mesmos assumidas no pretérito remoto e próximo; contudo o modo pelo qual nos desvencilhamos dos efeitos de nossas próprias obras facilita ou dificulta a nossa marcha redentora na estrada que o mundo oferece.

Importa notar ainda que as leis naturais, ou divinas, têm por objetivo último o bem da criatura. É fácil perceber, por exemplo, que as dores físicas conseqüentes a algumas de nossas ações visam à preservação de nosso corpo. Assim, se não sentíssemos dor ao tocar um objeto quente, não o soltaríamos imediatamente, resultando daí lesões graves em nossa mão. De igual modo, as dores morais, e mesmo certas dores físicas sem causa imediata, objetivam à nossa educação espiritual. Ajudam-nos a ver que, com nossas ações, interferimos indebitamente na harmonia do Universo, violando as leis de amor que nos devem guiar o comportamento frente aos homens e demais seres da criação.

Consideremos um exemplo: uma pessoa resolve embriagar-se e, nesse estado, põe-se a dirigir um veículo. Em seu percurso, atropela um pedestre, ferindo-o gravemente. O motorista contrai, nesse instante, um débito para com a lei divina, que lhe será causa de sofrimentos futuros. Cedo ou tarde enfrentará as conseqüências dolorosas de seu ato, tendo ainda que reparar o mal causado ao seu próximo. Mas como Deus não é apenas a suprema justiça, mas também a suprema bondade, o devedor não precisará pagar sua dívida com a mesma "moeda"; poderá, por vontade própria, resolver saldá-la com amor. Eis porque o apóstolo afirmou: "O amor cobre a multidão de pecados" (I Pedro 4: 8), contrapondo-se ao ditado de que "quem com ferro fere, com ferro será ferido".

Para o pedestre, a ocorrência possivelmente representará o efeito de uma dívida anteriormente contraída, de um erro cometido no passado próximo ou distante. Terá sido uma forma bastante dura de aprender e resgatar, determinada pelas necessidades do seu caso particular. Em outros casos, o aprendizado e a expiação de erros semelhantes podem ser alcançados por processos mais brandos, menos dolorosos.

A lei pode ser flexibilizada, porque seu objetivo é sempre educar, nunca punir. Se a criatura já aprendeu a lição, reparou seu erro e está exercendo o amor, não mais precisa continuar sofrendo. Sobre esse ponto, é oportuna a leitura da seção "Código penal da vida futura", do capítulo 7 da primeira parte de O Céu e o Inferno, de Allan Kardec. Vejamos estes trechos:

16o. O arrependimento é o primeiro passo para a melhora; mas só isso não basta, sendo ainda precisas a expiação e a reparação.
Arrependimento, expiação e reparação são as três condições necessárias para apagar os traços de uma falta e suas conseqüências.
O arrependimento suaviza as dores da expiação, ao dar esperança e preparar os caminhos da reabilitação. Contudo, somente a reparação pode anular o efeito, destruindo a causa; o perdão seria uma graça, e não uma anulação.
17o. O arrependimento pode ocorrer em qualquer parte e em qualquer momento; se tardar, o culpado sofrerá por mais tempo.
A expiação consiste nos sofrimentos físicos e morais, que são a conseqüência da falta cometida, verificando-se quer já na vida presente, quer após a morte, na vida espiritual, ou ainda numa nova existência corporal, até que os traços da falta sejam apagados.
A reparação consiste em fazer o bem a quem se haja feito o mal. [...]

A possibilidade do abrandamento das conseqüências dolorosas de nossas ações pelos esforços que façamos nesse sentido é ilustrada em conhecido episódio narrado por Hilário Silva no livro A Vida Escreve (cap. 20, "O merecimento"):

Saturnino Pereira sofre um acidente na fábrica onde trabalha, vindo a perder o polegar direito. Seus colegas e amigos comentam a injustiça da ocorrência, dada a grande dedicação de Saturnino ao bem de todos. Comparecendo à reunião mediúnica em que colabora regularmente, um benfeitor espiritual espontaneamente lhe esclarece que, em existência anterior, foi poderoso sitiante que, num momento de crueldade, puniu barbaramente um pobre escravo, moendo-lhe o braço direito no engenho. Com o despertar de sua consciência, atrozes remorsos torturaram-no no além-túmulo. Deliberou então impor-se rigoroso aprendizado, programando um acidente para a futura encarnação, no qual perderia o braço. No entanto, sua renovação para o bem, testemunhada por suas ações, possibilitou que o acidente apenas lhe ocasionasse a perda de um dedo.

Notas


1. Algumas idéias deste texto foram motivadas por palestra proferida por José Carlos Angelo Cintra no âmbito da II Semana Espírita da Unicamp, promovida pelo Grupo de Estudos Espíritas da Unicamp, em outubro de 1995. [volta]

2. Algumas propostas têm-se difundido nos círculos leigos, misturando referências esparsas à física contemporânea com idéias religiosas, místicas etc. No entanto, uma análise autorizada e isenta revela que são prematuras e pouco rigorosas. O que estamos afirmando no texto não deve ser entendido como uma aprovação, ou mesmo um incentivo a trabalhos dessa natureza. Estamos apenas salientando que a visão da matéria fornecida pela ciência de hoje não representa mais um obstáculo à concepção espírita do homem como um ser dotado de livre-arbítrio. Sobre esse ponto, ver os artigos Xavier Jr. 1995, Chagas 1995 e Chibeni 1984. [volta]

3. Sobre a ciência espírita e suas relações com a ciência acadêmica, consultem-se Borges de Souza 1986, Chagas 1984, 1987 e 1994, Chibeni 1988, 1991 e 1994, bem como os trabalhos citados na nota 2. [volta]

4. Nesta e demais citações de obras de Allan Kardec, utilizamos os textos originais, aproveitando em grande parte as traduções publicadas pela Federação Espírita Brasileira. [volta]

5. Diante de certas ocorrências trágicas, é comum ouvir-se dizer que "tinham que acontecer", que "estavam escritas". Essa opinião, que o Espiritismo mostra incorreta quando generalizada, é analisada de forma interessante em Simonetti 1996. [volta]

Referências

  • BORGES DE SOUZA, J. "Pesquisas e métodos", Reformador, abril de 1986, pp. 99-101.
  • CHAGAS, A. P. "O que é a ciência", Reformador, março de 1984, pp. 80-83 e 93-95.
  • -----. "As provas científicas", Reformador, agosto de 1987, pp. 232-33.
  • -----. "A Ciência confirma o Espiritismo?" Reformador, julho de 1995, pp. 208-11.
  • -----. "O Espiritismo na Academia?" Revista Internacional de Espiritismo, fevereiro de 1994, pp. 20-22 e março de 1994, p. 41-43.
  • -----. Sobre a previsão do futuro. Revista Internacional de Espiritismo, maio de 1996, pp. 124-25.
  • CHIBENI, S.S. "Espiritismo e ciência", Reformador, maio de 1984, pp. 144-47 e 157-59.
  • -----. "A excelência metodológica do Espiritismo", Reformador, novembro de 1988, pp. 328-33, e dezembro de 1988, pp. 373-78.
  • -----. "Ciência espírita", Revista Internacional de Espiritismo, março de 1991, pp. 45-52.
  • -----. "O paradigma espírita", Reformador, junho de 1994, pp. 176-80.
  • EMMANUEL. "Fatalidade e livre-arbítrio" (Psicografia de F. C. Xavier.). In: Nascer e Renascer. São Bernardo do Campo, GEEM, 1982.
  • KARDEC, A. Le Livre des Esprits. Paris, Dervy-Livres, s.d. (dépôt légal 1985). O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro, 64a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, s.d.
  • -----.Le Ciel et l'Enfer. Farciennes, Editions de l'Union Spirite, 1951. O Céu e o Inferno. Trad. Manuel Quintão, 28a ed., Rio de Janeiro, Federação Espíria Brasileira, s.d.
  • SILVA, H. A Vida Escreve. (Psicografia de F. C. Xavier e Waldo Vieira.) 5a ed., Rio de Janeiro, Federação Espírita Brasileira, 1960.
  • SIMONETTI, R. "Tinha que acontecer?", Reformador, maio de 1996, pp. 138-39.
  • XAVIER JR., A. L. "Algumas considerações oportunas sobre a relação Espiritismo-Ciência", Reformador, agosto de 1995, pp. 244-46.

Artigo publicado em Reformador de junho de 1997, pp. 176-180.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

ANENCEFALIA

VIDASOCORRO À VIDA


Ame-se amando a vida

Nada no Universo ocorre como fenômeno caótico, resultado de alguma desordem que nele predomine. O que parece casual, destrutivo, é sempre efeito de uma programação transcendente, que objetiva a ordem, a harmonia.

De igual maneira, nos destinos humanos sempre vige a Lei de Causa e Efeito, como responsável legítima por todas as ocorrências, por mais diversificadas apresentem-se.

O Espírito progride através das experiências que lhe facultam desenvolver o conhecimento intelectual enquanto lapida as impurezas morais primitivas, transformando-as em emoções relevantes e libertadoras.

Agindo sob o impacto das tendências que nele jazem, fruto que são de vivências anteriores, elabora, inconscientemente, o programa a que se deve submeter na sucessão do tempo futuro.

Harmonia emocional, equilíbrio mental, saúde orgânica ou o seu inverso, em forma de transtornos de vária denominação, fazem-se ocorrência natural dessa elaborada e transata proposta evolutiva.

Todos experimentam, inevitavelmente, as consequências dos seus pensamentos, que são responsáveis pelas suas manifestações verbais e realizações exteriores.

Sentindo, intimamente, a presença de Deus, a convivência social e as imposições educacionais, criam condicionamentos que, infelizmente, em incontáveis indivíduos dão lugar às dúvidas atrozes em torno da sua origem espiritual, da sua imortalidade.

Mesmo quando se vincula a alguma doutrina religiosa, com as exceções compreensíveis, o comportamento moral permanece materialista, utilitarista, atado às paixões defluentes do egotismo.

Não fosse assim, e decerto, muitos benefícios adviriam da convicção espiritual, que sempre define as condutas saudáveis, por constituírem motivos de elevação, defluentes do dever e da razão.

Na falta desse equilíbrio, adota-se atitude de rebeldia, quando não se encontra satisfeito com a sucessão dos acontecimentos tidos como frustrantes, perturbadores, infelizes...
Desequipado de conteúdos superiores que proporcionam a autoconfiança, o otimismo, a esperança, essa revolta, estimulada pelo primarismo que ainda jaz no ser, trabalhando em favor do egoísmo, sempre transfere a responsabilidade dos sofrimentos, dos insucessos momentâneos aos outros, às circunstâncias ditas aziagas, que consideram injustas e, dominados pelo desespero fogem através de mecanismos derrotistas e infelizes que mais o degrada, entre os quais o nefando suicídio.

Na imensa gama de instrumentos utilizados para o autocídio, o que é praticado por armas de fogo ou mediante quedas espetaculares de edifícios, de abismos, desarticula o cérebro físico e praticamente o aniquila...

Não ficariam aí, porém, os danos perpetrados, alcançando os delicados tecidos do corpo perispiritual, que se encarregará de compor os futuros aparelhos materiais para o prosseguimento da jornada de evolução.

* * * * * *

É inevitável o renascimento daquele que assim buscou a extinção da vida, portando degenerescências físicas e mentais, particularmente a anencefalia.

Muitos desses assim considerados, no entanto, não são totalmente destituídos do órgão cerebral.

Há, desse modo, anencéfalos e anencéfalos.

Expressivo número de anencéfalos preserva o cérebro primitivo ou reptiliano, o diencéfalo e as raízes do núcleo neural que se vincula ao sistema nervoso central...

Necessitam viver no corpo, mesmo que a fatalidade da morte após o renascimento, reconduza-os ao mundo espiritual.

Interromper-lhes o desenvolvimento no útero materno é crime hediondo em relação à vida. Têm vida sim, embora em padrões diferentes dos considerados normais pelo conhecimento genético atual...

Não se tratam de coisas conduzidas interiormente pela mulher, mas de filhos, que não puderam concluir a formação orgânica total, pois que são resultado da concepção, da união do espermatozóide com o óvulo.

Faltou na gestante o ácido fólico, que se tornou responsável pela ocorrência terrível.

Sucede, porém, que a genitora igualmente não é vítima de injustiça divina ou da espúria Lei do Acaso, pois que foi corresponsável pelo suicídio daquele Espírito que agora a busca para juntos conseguirem o inadiável processo de reparação do crime, de recuperação da paz e do equilíbrio antes destruído.

Quando as legislações desvairam e descriminam o aborto do anencéfalo, facilitando a sua aplicação, a sociedade caminha, a passos largos, para a legitimação de todas as formas cruéis de abortamento.

... E quando a humanidade mata o feto, prepara-se para outros hediondos crimes que a cultura, a ética e a civilização já deveriam haver eliminado no vasto processo de crescimento intelecto-moral.

Todos os recentes governos ditatoriais e arbitrários iniciaram as suas dominações extravagantes e terríveis, tornando o aborto legal e culminando, na sucessão do tempo, com os campos de extermínio de vidas sob o açodar dos mórbidos preconceitos de raça, de etnia, de religião, de política, de sociedade...

A morbidez atinge, desse modo, o clímax, quando a vida é desvalorizada e o ser humano torna-se descartável.

As loucuras eugênicas, em busca de seres humanos perfeitos, respondem por crueldades inimagináveis, desde as crianças que eram assassinadas quando nasciam com qualquer tipo de imperfeição, não servindo para as guerras, na cultura espartana, como as que ainda são atiradas aos rios, por portarem deficiências, para morrer por afogamento, em algumas tribos primitivas.



Qual, porém, a diferença entre a atitude da civilização grega e o primarismo selvagem desses clãs e a moderna conduta em relação ao anencéfalo?



O processo de evolução, no entanto, é inevitável, e os criminosos legais de hoje, recomeçarão, no futuro, em novas experiências reencarnacionistas, sofrendo a frieza do comportamento, aprendendo através do sofrimento a respeitar a vida...

* * * * * *

Compadece-te e ama o filhinho que se encontra no teu ventre, suplicando-te sem palavras a oportunidade de redimir-se.

Considera que se ele houvesse nascido bem formado e normal, apresentando depois algum problema de idiotia, de hebefrenia, de degenerescência, perdendo as funções intelectivas, motoras ou de outra natureza, como acontece amiúde, se também o matarias?

Se exercitares o aborto do anencéfalo hoje, amanhã pedirás também a eliminação legal do filhinho limitado, poupando-te o sofrimento como se alega no caso da anencefalia.

Aprende a viver dignamente agora, para que o teu seja um amanhã de bênçãos e de felicidade.

Joanna de Ângelis

(Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, na reunião mediúnica da noite de 11 de abril de 2012, no Centro Espírita Caminho da Redenção, em Salvador, Bahia

A decisão do STF sobre os fetos anencéfalos

Wellington Balbo – Bauru SP

A vida na Terra é feita das mais diversas provações. São testes que como alunos da vida temos de passar para, enfim, obtermos o diploma e o conhecimento necessários para irmos adiante, avançando na hierarquia dos mundos e podendo, então, crescer como espíritos imortais. A Terra é apenas uma escola, um estágio evolutivo e não ficaremos nela para sempre.

Portanto, as provas podem ser vistass como desafios que são necessários ao nosso aprimoramento. Temos de pasar por elas, não adianta adiar.

Esta introdução é para mostrar que por mais complicados sejam nossas provas podemos vencê-las realizando esforços. E que esforço deve realizar uma mãe e toda família ao decidir levar adiante a gravidez de um feto anencéfalo. Não queremos aqui minimizar o sofrimento de quem quer que seja, tampouco sermos juízes julgando implacavelmente o comportamento alheio. Sabemos das dores, ou melhor, imaginamos que sejam dores pungentes.

No entanto, o que queremos aqui é mostrar um outro ponto da questão, o lado espiritual. Alunos em trânsito por esta escola temporária é de suma importância que nos atentemos para o fato de que nossa história não começa aqui, ao nascermos. Somos espíritos milenares carregando bagagens e necessidades evolutivas das mais diversas. Somos seres bem antigos, temos biografia espiritual, temos história...

O filho que trazemos no ventre, seja com ou sem cérebro é, acima de qualquer coisa um espírito que necessita passar por esta prova. Em face de tão grave realidade fica o questionamento:

Será útil para aquela criatura que abrigamos no ventre interromper a gravidez?

E a sua realidade, suas necessidades evolutivas? Será justo pensarmos apenas em nosso sofrimento e esquecermos de que ali está um espírito imortal que precisa de nosso amor e carinho? Lembro da querida educadora Maria Montessori que afirmava que a educação começa no ventre. Será que poderíamos praticar esta educação da alma com relação ao filho que temos em nosso seio? Será que poderíamos dizer: Eu te amo, você é amado e poderá nesta encarnação viver poucas horas, mas ainda assim será amado e retornará, quem sabe, à nossa família para darmos prosseguimento a nossa história.

Ah, a reencarnação! Só mesmo a reencarnação para abrir as chaves do intrincado labirinto dos sentimentos humanos, explicando o que é para muitos inexplicável e pode ser resolvido com uma simplista votação sem os aprofundamentos adequados nas questões do espírito imortal.


Sem o conhecimento da reencarnação qualquer tipo de julgamento acerca de temas como, por exemplo, a interrupção da gravidez em caso de fetos anencéfalos é capenga. Os ministros do STF, sem o conhecimento das necessidades evolutivas dos espíritos que habitam a Terra, optaram por permitir que a gravidez seja interrompida. Como espírita discordo da decisão dos magistrados. Repetimos que não desprezamos a dor e a dificuldade da mãe que se depara com tão complicada provação, todavia vale lembrar que, como dissemos acima, este é um planeta de provas e, indubitavelmente, interromper a gravidez equivale a entregar a prova ao professor sem responder as questões mais importantes.

Queridos amigos - Pensemos nisso!

Beijos de luz.



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sexta-feira, 13 de abril de 2012

RAZÕES PARA SER CONTRA O ABORTO DO ANENCÉFALO

(Folha Espírita - Agosto/2004) em http://www.amebrasil.org.br/html/aborto_razoes.htm
À primeira vista, pode parecer que as razões contrárias ao abortamento provocado sejam exclusivamente da alçada da religião. Uma reflexão mais acurada, porém, demonstrará que elas têm raízes profundas na própria ciência. Assim, para sermos fiéis à verdade e discutirmos, sem as amarras obliterantes do preconceito, a complexa e multifacetada questão dos direitos do embrião, é indispensável analisarmos os argumentos científicos contrários ao aborto.
O primeiro passo nessa busca é a descoberta do verdadeiro significado do zigoto à luz das Ciências da Vida.
Para Moore e Persaud (2000, p. 2), “o desenvolvimento humano é um processo contínuo que começa quando o ovócito de uma mulher é fertilizado por um espermatozóide de um homem. O desenvolvimento envolve muitas modificações que transformam uma única célula, o zigoto (ovo fertilizado), em um ser humano multicelular”. Ainda segundo os ilustres embriologistas, o zigoto e o embrião inicial são organismos humanos vivos, nos quais já estão fixadas todas as bases do indivíduo adulto. Sendo assim, não é possível interromper qualquer ponto do continuum – zigoto, feto, criança, adulto, velho – sem causar danos irreversíveis ao bem maior, que é a própria vida.
Mas há muito mais sobre o zigoto. É impossível deixar de reconhecer que é uma célula extremamente especializada, que passou pelo buril do tempo, herdeira de bilhões de anos de evolução. Dos cristais minerais ao ser humano, as células primitivas passaram por um longo e extraordinário percurso, desde os procariontes aos eucariontes, dos seres mais simples aos mais complexos, até surgirem, magníficas, nas múltiplas especializações dos órgãos humanos. E a célula-ovo é um dos exemplos mais admiráveis, porque encerra em si mesma, potencialmente, todo o projeto de um novo ser, que é único e insubstituível.
Nesse sentido, a investigação sobre a estrutura do zigoto nos leva necessariamente à discussão sobre a origem da vida e seu significado científico, com todas as conseqüências disso para discussões bioéticas, morais, políticas e religiosas. Não será possível retomar aqui toda a argumentação desenvolvida em O Clamor da Vida (NOBRE, 2000), de modo que apresentarei unicamente alguns dos pontos centrais envolvidos.
Reconhecemos o grande valor da Teoria Neodarwiniana e de seus pressupostos básicos – a evolução das espécies, a mutação e a seleção natural – já comprovados pela investigação científica. Ela, porém, tem se revelado insuficiente para explicar a evolução como um todo, porque tem no acaso um dos seus pilares. O mesmo acontece com todas as outras teorias que buscam complementá-la, mantendo a mesma base explicativa, como as de Orgel, Eigen, Gilbert, Monod, Dawkins, Kimura, Gould, Kauffman. Demonstrou-se, por exemplo, através de cálculos matemáticos, a impossibilidade estatística (101000 contra um) de se juntar, ao acaso, mil enzimas das duas mil necessárias ao funcionamento de uma célula. Do mesmo modo, já se constatou que o acaso é insuficiente para explicar, passo a passo, de forma detalhada, científica, o surgimento de estruturas complexas, como o olho, o cílio ou flagelo, a coagulação sanguínea.
Por isso, acreditamos que a Teoria do Planejamento Inteligente, que não tem por base o acaso e é defendida por cientistas competentes, como o bioquímico Michael Behe, a bióloga Lynn Margulis, e os físicos Ígor e Grischka Bogdanov, possui argumentos científicos bem mais sólidos para explicar a evolução dos seres vivos. Behe, em seu livro A Caixa Preta de Darwin, afirma que não importa o nome que se lhe dê, mas, para ele, indiscutivelmente, a vida tem um Planejador. Esta mesma conclusão está em Deus e a Ciência, obra de J. Guitton e dos irmãos Bogdanov. Na mesma linha de raciocínio, Margulis e Sagan (2002, p. 23) afirmam: “Nem o DNA nem qualquer outro tipo de molécula, por si só, é capaz de explicar a vida”.
Esses autores foram buscar suas argumentações científicas no estudo da extraordinária maquinaria celular; no jogo de convenções inexplicáveis, como as ligações covalentes, a estabilização topológica de cargas, a ligação gene-proteína, a quiralidade esquerda dos aminoácidos e direita dos açúcares; como também, nos cálculos matemáticos das enzimas celulares e na análise de estruturas complexas, já referidos. Enfim, um mundo de complexidade, que não pode ser reduzido à simples obra do acaso.
O fato é que o cientista, nem de longe nem de perto, tem conseguido “fabricar” moléculas da vida. Ele desconhece, portanto, como reproduzir, em laboratório, as forças que entram em jogo nesse intrincado fenômeno. Nessas circunstâncias, deveria adotar uma atitude mais humilde, mais reverente, diante desse bem maior que é concedido ao ser humano, o de viver.
Pois, a cada dia, chegam novos aportes científicos para a compreensão da verdadeira natureza do embrião. Descobertas recentes, feitas pela neurocientista Candace Pert e equipe, demonstram que a memória estaria presente não somente no cérebro, mas em todo o corpo, através da ação dos neuropeptídeos, que fazem a interconexão entre os sistemas – nervoso, endócrino e imunológico –, possibilitando o funcionamento de um único sistema que se inter-relaciona o tempo todo, o corpo-cérebro.
Outras pesquisas já detectaram a presença, no zigoto, de registros (“imprints”) mnemônicos próprios, que evidenciam a riqueza da personalidade humana, manifestando-se, muito cedo, na embriogênese. São também notáveis as pesquisas da dra. Alessandra Piontelli e demais especialistas que têm desvendado as surpreendentes facetas do psiquismo fetal, através do estudo de ultra-sonografias, feitas a partir do 4º mês de gestação, e do acompanhamento psicológico pós-parto, até o 3º ou 4º ano de vida da criança. O conjunto desses e de outros trabalhos demonstra a competência do embrião: capacidade para autogerir-se mentalmente, adequar-se a situações novas; selecionar situações e aproveitar experiências.
Se unirmos a Teoria do Planejamento Inteligente a essas novas descobertas, vamos concluir, baseados na ciência, que a vida do embrião não pertence à mãe, ao pai, ao juiz, à equipe médica, ao Estado. Pertence, exclusivamente, a ele mesmo, porque a vida é um bem outorgado, indisponível.
Há, pois, fortes razões científicas para ser contra o aborto, mesmo o do anencéfalo. Aprendemos, com a genética, que a diversidade é a nossa maior riqueza coletiva. E o feto anômalo, mesmo o portador de grave deficiência, como é o caso do anencéfalo, faz parte dessa diversidade. Deve ser, portanto, preservado e respeitado.
Reconhecemos que a mulher que gera um feto deficiente precisa de ajuda psicológica por longo tempo; constatamos, porém, que, na prática, esse direito não lhe é assegurado. Sem ajuda para trabalhar o seu sentimento de culpa, ela pode exacerbá-lo pela incitação à violência contra o feto, e mesmo permanecer nele, por tempo indeterminado. Seria importante que inclinasse seu coração à compaixão e à misericórdia, mostrando-lhe o real significado da vida.
CNBB se posiciona contra o aborto em casos de fetos com anencefalia
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil divulgou, em nota oficial assinada por seu presidente, dom Geraldo Majella, pelo vice-presidente, dom Antônio Celso de Queiros, e pelo secretário-geral, dom Odilo Shcherer, que a interrupção da gravidez em casos de anencefalia do feto deveria ter sido tomada depois de ampla reflexão pela sociedade e participação do plenário da instituição. Para a CNBB, o ministro Marco Aurélio “autorizou a interrupção voluntária da gestação de uma vida humana”. A nota diz ainda: “... a vida humana, que se forma no seio da mãe, já é um novo sujeito de direitos e, por isso, tal vida deve ser respeitada sempre, não importando o estágio ou a condição em que ela se encontre”.
A visão de um delegado espírita
"Não se pode considerar como absoluta a morte do anencéfalo. O ser humano não possui o dom da vida, embora possa iniciá-la através da união carnal ou fecundação in vitro. O primado do processo civilizatório se encontra centrado na ampla defesa da pessoa no plano material e espiritual.
O respeito à vida, em qualquer nível em que ela se encontre, é uma conquista contemporânea da civilização. O que anima a natureza é exatamente a vida que se encontra presente nela, em todos os seus planos – desde o vegetal até o animal.
Assim, se houver um fundamento que justifique a morte, em qualquer estágio que a vida se encontre, não teremos motivos para evitá-la quando ela estiver situada em seus patamares mais elevados. Os argumentos que justificam a morte do anencéfalo serão os mesmo que justificariam a subtração da vida de qualquer outra pessoa – ou será que existem pessoas com mais vida e outras com menos vida?"
Clayton Reis - delegado da Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas - PR.
Por que dizer não ao aborto de fetos anencéfalos na visão de um médico espírita
"A decisão do STJ em liberar a realização de abortos em casos de anencefalia não é correta. O anencéfalo é um ser vivo intra-útero. Ele nasce com vida e vai a óbito com minutos, dias, meses ou após anos. Se ele nasce vivo, o aborto é criminoso, pois lhe ceifa a oportunidade e a experiência da reencarnação.
Todos temos direito à vida, aos recursos existentes e, conseqüentemente, a uma morte natural, com toda a assistência médica. Acreditamos que há necessidade de uma maior reflexão por parte das autoridades brasileiras, um consenso entre todos os segmentos da sociedade e um cuidado na elaboração de medidas que venham comprometer a vida."
Laércio Furlan – médico e professor aposentado da UFPR; presidente da Associação Médico-Espírita do Paraná; coordenador da Campanha VIDA, SIM À GRAVIDEZ – Não ao Aborto
O que diz o Livro dos Espíritos?
Pergunta 344: “Em que momento a alma se une ao corpo?”
Resposta: “... desde o instante da concepção, o espírito designado a habitar certo corpo, a este se liga por um laço fluídico”.